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O ESTADO É O MAIS BRUTAL VIOLADOR DOS DIREITOS HUMANOS

O ESTADO É O MAIS BRUTAL VIOLADOR DOS DIREITOS HUMANOS
– André L. Soares – 08.12.2008
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A primeira vez que fui chamado a dar alguma atenção à Declaração Universal dos Direitos Humanos eu tinha entre dezoito e vinte anos. Foi durante um show de Raul Seixas, realizado em Brasília, ainda nos anos oitenta. Em meio à música ‘Sociedade Alternativa’ nosso ‘Maluco Beleza’ puxou um pergaminho e começou a ler, na íntegra, essa Carta Internacional. Após cada artigo cantava: ‘viva, viva, viva a sociedade alternativa’.
A coisa foi ficando chata. O público candango é impaciente. Das vaias, logo passou a palavrões e, depois, começou a lançar lixo ao palco. ‘Chapado’, Raulzito continuava a leitura. A noite tendia a acabar mal. E acabou mesmo.
Antes que a canção terminasse o ‘batalhão de choque’ havia cercado o local: centenas de homens armados, cães, canhões de água e gás lacrimogêneo. A arena transformou-se em palco de guerra. Quem não correu muito, apanhou bastante e foi preso. Democrática, a polícia distribuiu pancada sem distinção: apanharam homens, mulheres, adolescentes, deficientes; apanhou quem estava tumultuando; e quem não estava, também. Alguns afirmam que houve mortos. O Correio Braziliense não confirmou. Eu não fiquei para testemunhar. Corri o quanto pude e, por sorte, escapei dos ‘home’.
Daquilo tudo tirei uma conclusão: é o Estado, sempre, quem mais fere os direitos humanos. Naquela noite, muita coisa poderia ter sido feita para evitar aquele desfecho. Mas o Estado raramente vai por esse caminho, porque, no Brasil, o Estado nunca esteve comprometido com os direitos humanos.
A Declaração, em seu art. 3, diz que ‘todo o homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal’. O art. 5 assevera que ‘ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante’. Já o art. 9 garante que ‘ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado’.
Mas não é isso que se vê na prática. Além dessas violações comuns em eventos públicos, no Brasil o Estado sempre foi criminoso. Não há outro termo. O auge foi o período da ditadura militar pós-64. Mas não foi a único.
O governo Collor confiscou os ativos financeiros de todo o país, ferindo o art. 17 da Declaração aqui analisada. Essa foi, provavelmente, a segunda maior agressão ao direito de propriedade no século XX, perdendo apenas para o que os nazistas fizeram em relação aos bens dos judeus alemães.
Basta rápida visita à história brasileira dos últimos 50 anos, para elencar alguns absurdos: tortura e assassinato de integrantes da ‘esquerda’ política; expulsão de artistas, ativistas e pensadores que combatiam o regime militar; assassinato dos operários da CSN (Volta Redonda); chacina do ‘Carandiru’; chacina de ‘Eldorado dos Carajás’; fazendas de escravos que ainda hoje existem no Matogrosso, Minas e Goiás (sem que o governo intervenha de modo eficaz); sistema penitenciário desumano, em que o apenado sai mais violento do que era, quando entrou; e por aí vai.
Tudo isso porque o Estado é sempre o maior e mais brutal violador dos Direitos Humanos. O Estado: justamente a instituição que mais deveria garantir tais direitos.
E isso somente acontece porque nós – o povo – permitimos. Não estou falando de revolta armada ou afim. Refiro-me ao avivamento da memória: a não deixar que se esqueçam tais erros. A não permitir, por exemplo, que quem confiscou a propriedade monetária de toda a nação seja reeleito. A não mais consumir produtos e serviços de empresa que pactue com esse tipo de governo.
Nós podemos fazer, sim, resistência pacífica – porém, não menos combativa – contra toda sorte de violações aos direitos humanos no Brasil. Basta combinarmos nossos papéis sociais como eleitores aos de consumidores, que os efeitos não tardam a surgir.
E pode-se ainda estender isso a outros povos. Desde que soube que a Nike paga, em média, salário mensal no valor de míseros US$30,00 a um empregado em sua fábrica na China, onde produz o par de tênis que me vendia por cerca de US$300,00, deixei de consumir tal marca. É uma gota d’água minha ação? Sim. Mas é o que posso fazer, na condição individual. E continuarei a fazer, sempre que puder.
Afinal, se não fizermos nada, a Declaração Universal dos Direitos Humanos continuará sendo ‘letra-morta’; ressuscitada em ‘flashes’ de justiça paliativa (que perdura apenas enquanto a imprensa está por perto), sempre que uma pessoa – física ou jurídica – perceba a oportunidade de tirar proveito da situação.
Hoje, infelizmente, os direitos humanos existem tão-somente como meta a ser alcançada. São, portanto, utópicos. Nosso maior desafio, como construtores da história do terceiro milênio, é fazer com que esses mesmos direitos se consolidem na prática cotidiana.
Este ‘post’ integra a ‘blogagem coletiva’ referente à comemoração dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos’, proposta pelo Sam, do blog ‘Fênix ad Eternum’, a quem agradeço por ter convocado a blogosfera a participar de mais essa importante reflexão.
Aos poucos, os internautas brasileiros vão percebendo que blog não serve apenas para se expor cópia dos vídeos manjados do ‘YouTube’.
Feliz com o resultado, parabenizo todos os demais participantes. Grande abraço a todos!
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